quarta-feira, 6 de março de 2013

Impressões ou umas quantas trivialidades sobre a morte de Chávez

Quando falamos de Chávez, vem-me sempre à memória aquele dia feito de golpe de estado malogrado. Golpe orquestrado por uma democrática oposição, amiga do velho rotativismo oligo-democrático de Carlos Andrés Pérez e cia, e que agora tinha de se haver com um intruso parvenu. Percebeu que, via eleições, o intruso seria um osso bem duro de roer, e então resolveu fazer uso de militares amigos. Mas os tempos eram feitos de mudança: a guerra fria havia terminado, e os americanos, ocupados com outros afazeres bem mais interessantes, não se empenharam a fundo nessa nobre e democrática tarefa. Os desvalidos, esses, reviam-se em Chávez. Sentiam-se por uma vez portadores de uma qualquer  vontade de poder e, assim, tomaram as ruas de Caracas, resgatando o presidente eleito.
Desde esse dia, ao ver essas imagens na televisão, entrevi que estávamos perante um daqueles fenómenos políticos com que, de tempos a tempos, a América Latina nos brinda. E que iria ter longa vida no poder. E foram catorze anos de muitas eleições,com plebiscitos pelo meio, e de grandes mudanças sociais  nesse país, a Venezuela, rica em petróleo, mas paupérrima em bem-estar. Com Chávez, os cuidados primários de saúde chegaram até muitos antes deles desprovidos. E a mortalidade infantil recuou para metade. A pobreza diminuiu significativamente, embora ainda seja uma marca da paisagem social. E muitos tiveram pela primeira vez acesso à educação. Acima de tudo, penso que o maior legado de Chávez é ter trazido para a cidadania democrática tantos que dela estavam excluídos.
É certo, houve  o lastro de populismo e a (velha) tentação de se perpetuar no poder. Mas esse populismo também deve ser contextualizado, compreendido dentro das realidade político-culturais da América Latina,  e no facto de não haver um partido estruturado a mediar a relação entre os apoiantes e o líder (o esboço de partido veio depois). E, com isto termino as minhas trivialidades, acreditando que uma qualquer espécie de chavismo perdurará para além de Chávez. Tal como o peronismo não soçobrou com a morte de Juan e Eva.
Chávez foi o detonador da vaga de esquerda na América Latina.Uma vaga democrática.

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