terça-feira, 21 de junho de 2011

Basta um dia

Pra mim
Basta um dia
Não mais que um dia
Um meio dia
Me dá
Só um dia
E eu faço desatar
A minha fantasia
Só um
Belo dia
Pois se jura, se esconjura
Se ama e se tortura
Se tritura, se atura e se cura
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só
O que eu pedia
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia

Só um
Santo dia
Pois se beija, se maltrata
Se como e se mata
Se arremata, se acata e se trata
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só
O que eu pedia, viu
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia

Chico Buarque

Pedro Hestnes



















Morreu Pedro Hestnes. Tinha 49 anos.
Recordamos Agosto. Para nós, haverá sempre Agosto.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Impressões das Legislativas


Olhando para as legislativas de 7 de Junho e, em pano de fundo, para os resultados eleitorais da última (quase) década, sobressai a inequívoca vitória do Partido Social Democrata, com a obtenção do maior número de votos e de mandatos na composição da futura assembleia. Contudo, não foi a esmagadora vitória cantada pela generalidade dos comentadores: o PSD não só não obteve a maioria absoluta, como ficou abaixo da votação das legislativas de 2002, de que então emergiu também vencedor. Argumentar-se-á que o número de deputados será certamente superior ao de 2002, visto que ainda não foram apurados os resultados dos círculos da Europa e de Fora da Europa, cuja contagem atribui, regra geral, entre dois a três mandatos ao PSD. Ficará com mais dois ou três deputados, mas é duvidoso que consiga preencher o fosso de votos: 55.313 votos de diferença separam o PSD de Barroso do PSD de Passos Coelho.


O CDS/PP emerge também vencedor das legislativas últimas. Cresce em número de votos e de mandatos (tem tantos quantos a CDU e o BE juntos, proeza assaz assinalável). O crescimento deste partido tem sido sustentado ao longo dos últimos actos eleitorais, sinal das (reconhecidas) qualidades de liderança de Paulo Portas e de um bom punhado de bons quadros políticos, passe a redundância.
É certo que o resultado foi obscurecido pelas expectativas de um resultado ainda maior, que algumas sondagens lhe prognosticavam e que o seu líder ampliou, ao fixar metas talvez além da realidade política nacional, cativa dos dois partidos clientelares do regime, PS e PSD. Em todo o caso, um bom resultado: o CDS não só resiste ao voto útil, como consegue crescer num contexto de crescimento eleitoral do PSD.


O PS sofre uma pesada derrota, sendo necessário recuar mais de duas décadas (mais precisamente a 1987) para encontrar um resultado ainda pior. Nem o (ilusório) empate técnico propagado incessantemente por tantas e tão estranhas sondagens evitou a débacle eleitoral. Demitiu-se Sócrates e um conjunto de personagens que, se espera, vão rapidamente e em força para o caixote de lixo da História.

A CDU, como já era esperado, resiste à sua maneira. Perde votos em relação às legislativas de 2009 (mais de 5 mil), mas ganha mais um deputado, eleito por Faro, o que é um proeza histórica, diga-se de passagem. Ao contrário de alguns comentadores que não se cansam de explanar a sua falta de rigor pelos ecrãs televisivos, a CDU não fica dever este mandato ao aumento do número deputados a eleger pelo círculo de Faro (mais um do que em 2009). Foi a cabeça de lista do Bloco de Esquerda, Cecília Honório, a última deputada a ter sido eleita por este círculo, quem beneficiou do aumento de lugares elegíveis.

E quanto ao BE, a derrota foi pesada: perde mais de duzentos mil votos e metade dos deputados eleitos em 2009. É um resultado difícil de digerir para os seus dirigentes e militantes, mas é a expressão do equívoco em que caíram: ignoraram a diversidade de interesses e causas dos eleitores que têm votado no BE, imaginado ter um núcleo eleitoral estável e homogéneo, talvez à imagem e semelhança do PCP. Logro que lhes custou caro.
Estranha-se ver dirigentes, que por mais de uma vez deram provas de argúcia política, enredados numa lógica de mimetização do PC, ignorando, desprezando, a sociologia dos eleitores. Dos eleitores que permitiram ao Bloco crescer e soltar-se das baias dos partidos e formações políticas que estiveram na sua origem. O caminho parece ser agora o inverso, com o Bloco a encerrar-se sobre si mesmo, e a ser meramente um palco de repartição de poder entre os dirigentes daquelas formações que lhe deram corpo. A ser assim reforça-se a clivagem entre dirigentes e militantes, por um lado, e os eleitores por outro. E o desenlace será a crónica de um definhamento anunciado: até não haver outro caminho, para os seus dirigentes e militantes, a não ser ir bater à porta do PCP. Só que nessa altura é muito duvidoso que essa porta se abra.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

A crise e a esquerda da esquerda

Nada de novo na História. Em tempo de crise, é a direita quem colhe os frutos. A esquerda que advoga a mudança de paradigma vê o seu parco pecúlio de votos minguar.

Portugal não é excepção à regra, na vaga conservadora que assola a Europa. A esquerda não esteve no governo, não abraçou os dogmas que nos precipitaram para esta crise, mas acaba por ser a primeira vítima destes tempos de chumbo. Em que o medo se apossa dos espíritos.

O PC e o BE, já que falamos de esquerda, bem se esforçaram por impor na agenda política as coisas do memorando. Mas, fora a questão da Taxa Social Única, esse (meritório) esforço acabou submergido pelo circo mediático montado pelos estados-maiores dos dois partidos clientelares do sistema político, o PS e o PSD, muito ajudados pelo jornalismo (medíocre) de fretes e a lógica do espctáculo que impregna os media.

Seria importante que estes partidos da esquerda tivessem uma boa votação nas legislativas de 5 Junho próximo. Mas não é de crer que tal venha a suceder. Não é aqui o tempo de dissecar o BE nem o PC, mas não deixo, num registo mais ou menos feito de impressões, de fazer ressaltar duas ou três coisas sobre estas duas formações: o PC (melhor dizendo, a sua direcção) não está muito interessado em crescer eleitoralmente. Sente-se confortável com o seu fiel eleitorado que lhe garante a sempiterna votação na casa dos 7 ou dos 8%, mais um bom punhado de autarquias nas suas áreas de influência tradicional. Os seus dirigentes parecem ter como máxima a preservação do equilíbrio interno da organização. Ou a perpetuação de um intrincado esquema de sanções e recompensas (mais simbólicas do que materiais) que decorrem do exercício do poder num partido com uma longa história e sólidos rituais. O crescimento eleitoral poderia gerar tensões e pôr em causa esse equilíbrio. Já o BE parece não ter sabido gerir o sucesso eleitoral das legislativas. Nos últimos tempos, tem emergido uma força titubeante, desorientada. Por um momento, pareceu cair no logro de querer mimetizar o PC. O tiro foi corrigido nas duas semanas de campanha, mas pode não chegar para um bom resultado.

E, no entanto, estes partidos têm razão. Têm razão quando nos dizem não ser possível pagar a dívida nas condições impostas pelo triunvirato do FMI, BCE e Comissão Europeia. Têm razão quando apontam o efeito do custo da energia na (baixa) produtividade do trabalho. Têm razão na tributação das mais-valias geradas na especulação urbanista (bem, esta é uma questão mais cara ao Bloco). Entre outras coisas mais.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Os dois partidos...


Em votos desde 85, ou seja, nas últimas duas décadas e meia.
De 2002 para cá, desenha-se uma atenuação da hegemonia. Será talvez precipitado ver nisso uma tendência ou, dito de outro modo, o declínio do bloco central, pois os atavismos imperam nesta nossa sociedade.

Da campanha eleitoral


A campanha prossegue por entre arruadas e feiras. Atrás, as televisões com as sondagens em riste, bálsamo para uns, assombração para outros.
Retrato de uma realidade paralela à crise que tolhe a vida dos muitos. A crise retira-lhes a esperança e a cidadania. Sobra a aceitação em nome de uma réstia vida.
Nada disso incomoda os dois grandes partidos clientelares do regime, cujos candidatos munidos de um batalhão de assessores (expressão do cretinismo que tomou conta da política à portuguesa) se entretêm a lançar farpas um ao outro. São farpas de um teatro de marionetas. De um espectáculo de gosto duvidoso, mas que continua a render votos aos de sempre.