Não estive nas
manifestações do
dia da greve. O dia foi pontuado com outros afazeres, que não os do
trabalho (confesso ter aderido à paralisação). E só de longe espreitei
as imagens
televisivas da violência em São Bento e imediações. Da violência dos
manifestantes
e da polícia. Uma luta desigual, já se sabia, e inconsequente. Mas
acabou por
dar um tom europeu ao protesto de 14 de Dezembro.
Se das imagens pouco vi, dos
comentadores do costume livrei-me de boa porque fui ao cinema, arrastado por uma história do país do sol nascente. Uma história de um clã amaldiçoado, os Nakamoto do beco. Homens de grande beleza, incorrigíveis
sedutores, condenados a morrer jovens. Uns às mãos do ciúme, das mulheres ou
dos maridos destas. Outros pondo cobro à sua própria vida. Outros ainda vítimas
da sua condição social.
Pela tela, as estórias
de três
Nakamotos. São-nos contadas pela voz da parteira, a anciã da aldeia. Uma
aldeia à beira-mar; o horizonte era só o mar a serpentear colinas de
densas florestas. Uma forte corrente erótica percorre estas estórias marcadas pelo fatalismo. Marca o ritmo do filme.
A
tragédia dos Nakamotos parece ancorada num destino remoto. Talvez no
desígnio dos deuses (no início temos a imagem do local sagrado onde a
deusa
da floresta deu à luz o fogo). Essa é uma ilusão que o realizador Koji
Wakamatsu se encarrega de desfazer. O filme termina com uma canção que
nos fala-nos da proclamação do imperador Meiji, do desejo democrático de
abolir todas a formas de discriminação com origem no nascimento. Mas a
discriminação persistiu, e os Nakamotos continuaram vítimas de um
trágico destino social. Morriam cedo, mas muitos mais eram paridos,
assim dizia a canção. Porque se a vida é sofrimento, é também um
impulso maior.
Koji Wakamatsu
conheceu em vida a pobreza e a discriminação. O seu cinema é fortemente
implicado, imbuído de mensagens políticas e sociais. Por isso, acho que
Koji Wakamatsu rimou com a greve de 14 de Dezembro.
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